Manifesto
O Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (e eu também), vem a público manifestar-se nos termos a seguir:
1. O início do ano de 2006 vem sendo marcado por inúmeras expressões de violência contra crianças e adolescentes. Quase que diariamente as páginas dos jornais levam ao conhecimento da opinião pública casos de crianças abandonadas, torturadas, violentadas com os mais brutais requintes de crueldade;
2. Sabemos que essa realidade não é nova. Somos uma sociedade historicamente violenta, estruturada na desigualdade de classe, gênero, raça e etnia. Em nossa memória coletiva está o genocídio indígena, a escravidão negra e a opressão de milhões de homens e mulheres que constroem esse país;
3. Assim também é com os milhões de crianças e adolescentes. Estes, por sua condição geracional, não têm sua humanidade reconhecida, tendo seus direitos violados cotidianamente no lar, nas instituições, no espaço público, na comunidade;
4. Na contra-mão, essa mesma sociedade foi capaz de erguer um dos mais bem elaborados e sólidos marcos legais para garantia dos direitos de crianças e adolescentes, cuja melhor expressão é o Estatuto da Criança e do Adolescente, com 15 anos de promulgação. O ECA, à repetição da Constituição Federal, dispõe ser dever da família, da comunidade, do Poder Público, a absoluta prioridade na proteção integral dos direitos da população infanto-juvenil. Também estão no ECA as medidas de proteção para salvaguarda dos interesses fundamentais de crianças e adolescentes;
5. Contudo, não podemos deixar de registrar nossa indignação com o aumento da violência contra crianças e adolescentes, seja na família, nas instituições, nos centros de internação de adolescentes em conflito com a lei, ou nas comunidades;
6. O início do século XXI não pode vir a ser registrado na história deste país como período de sofrimento, dor e extermínio dirigidos à parcela da população que tem garantidos constitucionalmente seus direitos e proteção. Não podemos ir para a história como uma sociedade que perpetua a síndrome de Herodes;
7. Destarte, vimos a público expressar nossa indignação. Não há de se falar em desenvolvimento desta sociedade se não reconhecermos que boa parte dela, hoje nas escolas, nos centros de internação, nos assentamentos rurais e urbanos, nas comunidades periféricas, continua a ser objeto de nossa raiva, medo, descaso e frustração. Não queremos ser uma sociedade que se lembra da infância somente quando esta lhe causa incômodo na face da criança pobre que habita as ruas das grandes cidades;
8. O que vimos propor é a mobilização de todos os esforços para a afirmação da humanidade e da vida de crianças e adolescentes. Os direitos e as garantias conquistados pela sociedade brasileira são os instrumentos para esse desafio;
9. Ao invés de descaso, tortura e abandono, propomos à sociedade brasileira, especialmente aos poderes públicos, a urgência de cumprimento da Convenção sobre os Direitos da Criança, da Constituição Federal e do ECA, mediante o estabelecimento de uma agenda prioritária à infância. É essa a condição para superarmos a face iníqua que ainda nos envergonha;
10. Na infância repousa boa parte de nossa humanidade e das potencialidades de nossa transformação coletiva. Ao renegarmos a infância, estamos contrariando nossa condição humana e nossa dignidade. Rejeitar qualquer forma de violência contra crianças e garantir o exercício de seus direitos é a única condição para superar o atual estágio civilizacional em que estamos, substituindo a dor e o desrespeito pela proteção, cuidado e justiça.
Brasília, 16 de fevereiro de 2006 136a Assembléia Ordinária do CONANDA
E tenho dito, também. Cada vez eu acredito mais nos princípios que regem meu trabalho, sabia?
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